terça-feira, 24 de setembro de 2013

Parnasiana.


Não sou poetisa. 
Sou mera escrava escrivã
aprisionada ao delicioso dever
de transcrever a poesia
que é
vocês. 

quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Sobre os medos, e outras coisas menos.

A frase "A existência é um fardo" não me sai da cabeça, e abomina-me pensar que eu a pensei.
Hoje eu descia pelas ruas do centro sentindo na pele um calor abafado, no ar um cheio de mato urbano.
As pessoas transitavam em direções variadas, focadas em diferentes objetivos, sem se lembrarem que estão todas no mesmo barco, este barco chamado Terra, no qual a carranca é uma grande interrogação. 
Ocorreu-me de repente uma ideia: estamos no útero de Deus, e somos paridos na morte. Nascemos quando morremos. 

Entendo as pessoas com insônia: é o que acontece quando você se deita na cama, e sente a escuridão do quarto crescer à sua volta. Uma solidão incompreendida invade-lhe a alma e sente-se que a solidão e o escuro se fundem num monstro, que irá  lhe engolir se dormir. São nessas noites que fecho os olhos e penso repetidamente: "Quero sonhar, quero sonhar, quero sonhar". Nunca sonho. São nessas noites que penso no meu medo da chuva e também  na minha necessidade dela. Acho monstruoso que as pessoas se escondam da chuva, ela que vem com as melhores intenções: lavar, refrescar, renovar, fertilizar. 

Mas nada disso importa. Aprendi a descascar laranjas.

terça-feira, 17 de setembro de 2013

O Peso do ser é sustentável.


A existência é um fardo. 
Ninguém nos pergunta se queremos habitar por nove meses um lugar umidamente escuro e fechado, e antes mesmo de possuirmos consciência do que somos, já deram-nos um nome, já agregaram-nos diversos valores e construíram sobre nós uma infinidade de laços nos quais não tivemos participação. 

A partir da abertura dos olhos, do choro, da respiração, estamos suscetíveis a todas variáveis do ambiente, e todos os seus elementos entranham-se em nós, seja consciente ou inconscientemente. Ensinam-nos coisas como se rotulassem objetos necessitados de identificação: assim se come, assim se anda, assim se veste. Sorria, respeite, não seja agressivo. Corresponda a sorrisos e a sentimentos. Temos o hábito de gostar de quem gosta de nós, de respeitar os mais velhos, de abaixar as tampas dos sanitários depois de utilizá-los. Concedem-nos um amplo leque de instruções que não encerram em si um fim específico, uma significância que justifique que tenham nos trazido à existência. 

Nada justifica a existência, não nos perguntam se queremos habitá-la porque essa possibilidade não existe. Sua justificativa só existe a partir da sua não-justificativa: passamos a vida inteira tentando torná-la plausível, objetivando por suspirar, ao final: "Nada foi em vão, minha vida valeu apena".

Na desesperada corrida pelos motivos, deparamo-nos com o kitsch. O termo é alemão, é significa o valor que atribuímos a algo, que não é necessariamente o conteúdo verídico daquilo. Usualmente é empregado nos estudos de estética para designar uma categoria de objetos vulgares, baratos, de mau gosto, sentimentais, que copiam referências da cultura erudita sem critério e sem atingirem o nível de qualidade de seus modelos, e que se destinam ao consumo de massa. Embora o kitsch apresente a si mesmo como "profundo", "artístico", "importante" ou "emocionante", raramente estes qualificativos são adquiridos por características intrínsecas ao objeto, antes derivam de associações externas que seu público estabelece. Em síntese, os kitsch's são os ideais supérfluos que aderimos para justificar nossa complexa existência. Há o kitsch comunista, católico, protestante, feminista, judeu, entre milhares de outros. 

Geralmente os kitsch's preenchem lacunas sentimentais, vingam-se de situações, acobertam traumas, proporcionam conforto e equilíbrio. Entretanto são falsos, pois carregam em si a superficialidade dos conceitos que defendem, muito mais seu simbolismo e aparência do que a essência redentora. 

A essência. 
Os kitsch's de uma forma geral, anseiam conduzir à esta essência. Entretanto, nos perdemos entre seus preceitos. A essência é complexa demais e intraduzível por qualquer tipo de segmento, por mais que estes não poupem esforços para construir uma estrada até ela. Ela encontra-se dentro de cada ser, e apenas uma sensibilidade apuradíssima poderá percebê-la, a mesma que percebe ondulações sobre as águas, timbres dos pássaros e das risadas, e o movimento descrito por um folha ao cair. 

A justificativa existe e é real. Dispensa qualquer outra divagação a respeito da existência, a torna sustentável, quase leve.

Não deve ser questionada, pois somente quem a compreende, sente em seus efeitos a veracidade que contém em si. 
Existimos para os outros. Os outros, existem para nós. 

sábado, 7 de setembro de 2013

trouxe os lírios, josé?, disse Abgail

como assim ninguém me trouxe um lírio?
gosto de escrever no escuro porque é nele que as coisas me vêm
no escuro não vejo minha jarra vazia,
vazia, porque não me trouxeram lírios.
Talvez eles fossem felizes no jardim,
Mas e a mim?
Vazia, 
vazia.
jardim jaz josé.
Seus olhos não brilham mais.
os pés não o trazem mais ao meu portão.
suas mãos,não buscam, não me querem, eu te quero
mas um corpo sem sangue não deseja outro corpo
 e sobre os lírios que o cobrem sobre a terra, 
as pessoas pisam.
Me espera, vou com você. Não importa quantas flechas carrego no peito.
Alecrim. 



Douglas Oliveira e Sarah Rodrigues.

O menino que tinha pouco sono e muita prosa.

Amados,
vamos embora? Eles e elas têm que ficar, vamos só nós.
Pois sim, tenho vontade de voar.
E penso,
no vento,
no frio,
na alma,
na dança.

preciso só tirar o excesso de cabelo,
o excesso de vocês,
o excesso de desmazelo,

pra ser leve o suficiente para flutuar,
preciso tirar esse grito do peito.

Rodemos no ar com os silfos,
no fogo com as salamandras,
na terra com os duendes,
um elfo fará rodar meu coração.
na sua mão.
na sua mão.

Cansei de ter pouco tato e muita pele.



(poema muito mais do Douglas do que meu)


Doces para Alba.



Estou levando doces para Alba.
Na cesta,
brigadeiros, paçocas roubadas, balas de caramelo,
um baú de histórias recortadas,
e todos os sorrisos despreocupados que ela nos roubou.

Estou costurando um balão para ela,
para que derrame sua graça no ar,
encante com seus trejeitos os pássaros
e compartilhe seu brilho com as estrelas.

Nunca a vi com uma roupa escura.
Só uma saia preta,
mas as flores vermelho vibrante da estampa gritavam,
“esta saia pertence à Alba”.
suas roupas sintonizam-se com a alma:
clara, iluminada, leve
de quase voar para longe do corpo.
Mas não voa.
Pois o corpo diz:
"quero-lhe, alma de Alba,
para dar-lhe a graça de desfrutar dessa comunhão
que somos ambos,
corpo & alma.”
A ela, que diz:
“De-li-ci-nha!”

Delicinha é poder lhe levar essa cesta de doces,
na qual vão pedacinhos de corações,
um consideravelmente grande do meu.

Estou levando uma cesta de doces para Alba,
mas quando volto, é minha alma que se encontra açucarada,
pelo encontro com tão singular insanidade sã.

Eu dissertaria sobre sua importância nas vidas pelas quais passa, Alba.
Mas aqui se encontra uma singela poesia
para cobri-la de flores e dar-lhe o melhor doce,
que é o das palavras sinceras.

Dedico-a a você,
que é poesia completa,
e assim como Drummond e Adélia,

mereceu comentários angelicais ao nascer.

sexta-feira, 6 de setembro de 2013

A menina com o copo d'água.




Ela quer descansar.
quer tirar os sapatos, as lentes, as pessoas e os lugares.
Não suporta mais sentir.
cada vez que pulsa o coração, sente como se vidro estilhaçado percorresse suas veias.
Não reage à estímulos. Não consegue olha para cima porque seus olhos estão cansados.
perdeu mais que a fé, perdeu a força para tê-la.

Deram-na um copo d'água. Ela não entendeu.

Não dava para se afogar nele.