se eu te falar que eu gamei, ó
O carnaval é uma festa sem cheiros.
Pelas íngremes ladeiras diamantinenses deslizaram bebidas, juízos, pés cambaleantes, a dignidade de muita gente. É um lugar cheio de história, situado entre pedras. Onde o sol e a festa resolveram parar. Terra quente demais durante as tardes, fria sob a lua, estremeceu todos os meus sentidos. Enquanto a igreja amarela ardia debaixo do sol, um carro passava assoviando, e nós descíamos o morro absurdo, eu pensei que era bonito morar num país que declara: por cinco dias vamos festejar!
Vibrei com tanta cor, corpo, sabor, cheiro e barulho. Porque tudo tem sua hora, e carnaval é hora de esquecer. Há 360 dias para se preocupar com o que vestir, com o que comer, com o que vão pensar de determinado comportamento. E cinco para pegar uma caneca, a roupa mais fresca e cantar música ruim com estranhos. Esse arrocha é pra você que achou que eu tava aqui sofrendo, vai vendo. E eu vi: os casarões históricos refletidos numa infinidade de óculos de sol escondendo olhos já meio fora de órbita. Ouvi: as pedras-sabão vibrando com o batuque de tantos ritmos. Observei a ascensão e a decadência humana. A alegria, a euforia, a dança, seguidas da cabeça entre os pés esparramados na calçada. É uma pena que a grande maioria das pessoas sinta necessidade de chegar a tais estados, mas isso não desmerece a folia boa. Nem o fato de que a Coliseu ganhou uma república para disputar meu coração! República Litraço, o bonde confirmou. Além da mais óbvia constatação: um amor de três dias é infinitamente mais saboroso que um de três anos.
Aquela cidade reergueu em mim um leque de necessidades saudáveis, meu faminto desejo de equilíbrio nesta vida. Eu quero uma existência em cores fortes: com barulho, gente transitando e ficando, música boa e ruim. Quero copos gelados, e quando tocar então desce, desce, desce menina, eu desço mesmo. Depois eu subo para essas mediocridades diárias, afinal, são elas que contextualizam a diversão. Ah, para expressar bem o que foi meu carnaval, as letras deste texto abobado tinham que dançar. Porque foi isso. Diamantina é a farra boa no meu coração.